Autor(es): Ronaldo Mota Sardenberg |
Valor Econômico - 06/10/2009 |
O Brasil tem um dever de solidariedade com o povo-irmão de Honduras Apesar de afastado neste momento do Itamaraty, aventuro-me a participar, a título pessoal, na querela sobre a posição brasileira com relação à presente situação de crise em Honduras. No debate, é intensa a contribuição não apenas dos meios políticos, mas, pela primeira vez, também dos círculos diplomáticos brasileiros, em seu sentido mais amplo. Devemo-nos mover em Honduras no mesmo espírito que reflete a prioridade que temos dado às questões do Haiti, Timor Leste e Guiné Bissau. O Brasil tem um dever de solidariedade com o povo-irmão de Honduras. E por essa razão tem interesse em que sejam assegurados o progresso e a tranquilidade naquele país. Todas as nações da América Latina e do Caribe são parte significativa da região e merecem nossa especial atenção, independentemente de suas dimensões e grau de desenvolvimento. A política latino-americana do Brasil incorpora princípios básicos, como a convivência e a cooperação com nossos vizinhos, a contenção de danos, quando ocorram, nas crises regionais, e a defesa e afirmação dos ideais democráticos. Está claro que o Brasil nem gerou, nem contribuiu para gerar, a crise em Honduras e sua evolução. Também não é responsável por suas condições políticas ou econômicas. Nossos interesses na situação hondurenha são transparentes, não acolhem segundas intenções. Seria, porém, lamentável importarmos essa crise. Transportar a situação de Honduras para o plano do debate interno brasileiro é, no mínimo, desnecessário. Não seria essa a melhor forma de expressarmos nossa solidariedade. Noto que a repercussão internacional dos eventos em Tegucigalpa está passando quase despercebida no Brasil, o que dificulta sua interpretação. Na realidade, são convergentes as principais manifestações internacionais, quais sejam: duas resoluções adotadas pela Assembleia Geral da OEA; uma declaração do Grupo do Rio, em nível de Chanceleres; uma resolução da Assembleia Geral e uma declaração do Conselho de Segurança das Nações Unidas, assim como duas enérgicas declarações de seu secretário geral Ban Ki-moon, tanto no que se refere à condenação do golpe e da quebra da ordem constitucional e democrática quanto à exigência do retorno do presidente Zelaya a suas funções constitucionais. São frequentes ainda as referências explícitas à inadmissibilidade das pressões exercidas pelas autoridades de fato contra a integridade da embaixada brasileira em Tegucigalpa. Na OEA, são feitas menções diretas à Carta Interamericana da Democracia sobre o fortalecimento da institucionalidade democrática nos Estados membros, assim como à rejeição ao golpismo em nossa região. O Brasil está em plena sintonia com as decisões tomadas nos grandes foros internacionais. Sua iniciativa diretamente junto ao Conselho de Segurança, além de estar em linha com a Carta da ONU e de não haver alternativa, visava a prevenir uma situação de emergência que colocava em risco a integridade da embaixada, de seus funcionários e dos que nela se abrigaram. Além disso, fora rejeitada pelas autoridades de fato o ingresso em território hondurenho de uma missão de caráter diplomático, da OEA. É essencial a ativa participação de cada um de nossos países na solução da questão hondurenha, que os países latino-americanos devem tomar como sua. É imperioso entretanto reconhecer, em paralelo, que os EUA têm papel relevante a desempenhar no equacionamento dessa questão. A situação atual é complexa. E só será resolvida por meio de negociações, com a participação da OEA. Inexiste a alternativa de abandonar o presidente Zelaya à própria sorte, o que teria o efeito desastroso de consolidar e validar o golpe, com previsíveis repercussões regionais. Ratificaria também as tropelias cometidas pelos golpistas nas ruas de Tegucigalpa, inclusive contra a liberdade da imprensa hondurenha. A tarefa de hoje só pode ser a de promover a restauração da tranquilidade do povo-irmão hondurenho. A cooperação do Brasil e de outros países é crucial para que Honduras possa alcançar essa meta. É necessário que se mantenha o foco da atenção internacional em Honduras, cuja situação política é única, urgente e, objetivamente, sem paralelo na região. O compromisso essencial do Brasil é o de trilhar o caminho democrático. Ronaldo Mota Sardenberg é embaixador, ex-representante permanente do Brasil junto às Nações Unidas. |
terça-feira, 6 de outubro de 2009
A crise de Honduras hoje
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário