quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Brasil viveu oito anos em apenas um

O ano em que o Brasil mudou um pouco mais

2011: o ano em que o Brasil mudou um pouco mais

por Izaías Almada

Não estarei sendo nada original ao começar este artigo dizendo que em política, a distância que separa o “ideal” daquilo que é “possível fazer” é enorme. Frase que, por sua vez, também não quer dizer lá muita coisa. Portanto, será necessário contextualizar, como gostam de dizer alguns espíritos eruditos. Indicar a tese, tentar explicá-la, provocando a reflexão e o pensamento crítico, se a isso chegarmos.

Já me explico: o Brasil viveu oito anos em apenas um. A acachapante derrota política e moral da oposição e da elite conservadora brasileira nas últimas eleições de outubro poderá se transformar numa realidade mais alvissareira a partir de 2011. Muitos de nós já nos demos conta de que a vitória da presidenta Dilma Roussef não foi apenas uma questão de maior número de votos conseguidos. Longe disso. E são dois os primeiros indícios dessa óbvia constatação: a perda de rumo da coligação PSDB/DEM (o PPS já perdeu o rumo há mais tempo) e a composição do ministério do novo governo a ser empossado em janeiro.


Vamos por partes. Como se comportará a oposição diante de um governo que dará continuidade (e avançará em algumas áreas com toda certeza) a um ciclo de oito anos em que o Brasil mudou interna e externamente? Passamos de uma economia quebrada para uma economia sadia; passamos de um país subalterno internacionalmente a um país com idéias próprias nas suas relações exteriores; um país que criou milhões de empregos formais com carteira assinada no lugar da alta taxa de desemprego dos neoliberais de FHC; um país que soube enfrentar a grave crise econômica de 2008. E que quer ser soberano em matéria de petróleo. Qual será, então, a partir de 2011 o discurso da oposição?

Com certeza não incidirá nos mesmos erros dos últimos oitos anos, quando – ainda apoiada numa visão antiga de influência mediática da opinião pública – teve duas derrotas extraordinárias em 2006 e 2010, seja pelos méritos obtidos pela gestão do presidente Lula, seja pelos erros primários de achar que ainda detinha o poder político no país. E, o que é mais grave, de não ter competência na avaliação das questões políticas e sociais, sequer para ver que o Brasil estava mudando. Pensar que José Serra se dizia o ‘mais preparado’ para governar o Brasil. Brincadeira que lhe custou caro! Ainda deve desculpas ao povo brasileiro pelo ridículo de sua campanha.

Na outra extremidade dessa incompetência e dessa mediocridade, a presidenta Dilma Roussef (ela, Lula e o PT, diga-se) montou um ministério, senão de todo elogiável, já que ainda conta com três ou quatro nomes que estão mais ligados a uma visão de passado do que de futuro e que andam perigosamente sobre o fio da navalha do entreguismo e da corrupção, a presidenta montou um ministério – repito – de pessoas capacitadas para a tarefa que lhes cabe, de viés mais técnico operacional do que político, com visão mais social e humana do que apenas de números e estatísticas tão ao gosto dos ‘neoespertos’ da era FHC.
Contudo, um ministério que traz enormes esperanças de avanço do país transformado pelo governo do presidente Lula. E que, aliás, deixa a presidência com um índice de aprovação acima de 80%, como nunca antes na história desse país…

Mas voltemos ao ideal e ao possível. Os ideiais da presidenta Dilma Roussef foram marcados a ferro e fogo, temperados na militância política clandestina contra um governo autoritário, na prisão e na tortura. Isso não se muda com trinta dinheiros, a não ser para oportunistas ou pessoas de fraco caráter, cujos exemplos – infelizmente – não faltam na atual geografia política brasileira.

Os ideais de Dilma Roussef são os ideais de toda uma geração que chega a postos de comando na vida pública e na vida privada: inclusão social, extinção da miséria e do analfabetismo, educação e saúde para a maioria da população e para todos (quando isso for possível), melhor distribuição da renda, investimento em infraestrutura de saneamento básico, industrialização e geração de maior número de empregos, soberania energética, credibilidade e respeito internacional com uma diplomacia pela paz e não subalterna a interesses belicistas e de dominação.

Muitos, como eu, ainda acreditamos na alternativa socialista, mas essa é outra história. Há que se entender que, ao ser eleita presidente de todos os brasileiros, num país de capitalismo incipiente de pouco mais de meio século e enquadrado numa geopolítica de dependência, Dilma Roussef terá a responsabilidade de caminhar entre o ideal e o possível, procurando trilhar um caminho que – sem criar retrocessos políticos e institucionais – agregue forças produtivas, mentalidades, formadores de opinião, Universidade, Forças Armadas, sindicatos, movimentos sociais, enfim esse caldeirão de interesses tão díspares numa sociedade de formação democrática recente e ainda insegura quanto aos passos a dar.

Os conservadores, os defensores de uma democracia tutelada e em causa própria, os coronéis do latifúndio agrário e mediático, os cultuadores do ‘american way of life’, os jornalistas de coleira, os acadêmicos que teorizam sobre valores em decomposição, os instigadores de preconceitos, os moralistas de ocasião, os juristas de uma só classe social, os religiosos obscurantistas e fundamentalistas, os que sustentam a impunidade dos crimes de colarinho branco, os defensores da porrada no lugar do diálogo, os quinta-colunas e as viúvas da ditadura ainda vão continuar botando as manguinhas de fora. Será preciso união, coragem e convicção para continuar a enfrentá-los e derrotá-los, pacientemente, no dia a dia.

E isso começa no dia 01 de janeiro de 2011…

Izaías Almada é escritor, dramaturgo, autor – entre outros – do livro “Teatro de Arena: uma estética de resistência” (Boitempo) e “Venezuela povo e Forças Armadas” (Caros Amigos).

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Retirado do Escrevinhador

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