terça-feira, 13 de outubro de 2009

PLANO DE INCLUSÃO DIGITAL ATINGIRÁ 4.245 MUNICÍPIOS

REDE ESTATAL DE BANDA LARGA DEVE CHEGAR A 76% DO PAÍS

Valor Econômico - 13/10/2009

Estão avançados os estudos no governo para a criação da rede nacional de banda larga. O plano prevê a implantação de uma rede estatal de fibra ótica de 31.448 quilômetros, interligando 4.245 municípios (o equivalente a 76% do território nacional) e beneficiando 162 milhões de pessoas (87% do total). Trata-se do último grande projeto do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado da anunciada consolidação das leis sociais.

O projeto, segundo informou ao Valor o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, está orçado em R$ 1,1 bilhão e pode ser executado em 14 meses. Com o plano, que depende ainda de aprovação do presidente Lula, o governo pretende criar a infraestrutura necessária para viabilizar o acesso da maioria da população à internet. A meta é fazer isso a uma velocidade de conexão considerada rápida - 1 megabyte (1 Mbps). Hoje, 90% das conexões de internet no Brasil são feitas com velocidade inferior a 1 Mbps.

"Vai começar com 1 megabyte real de velocidade nos dois sentidos, ou seja, um mega de "upload" (envio de arquivos) e 1 mega de "download" (recebimento). O custo para elevar depois a capacidade é marginal", afirmou Santanna, principal idealizador do Plano Nacional de Banda Larga.

O presidente Lula quer, com o projeto, promover inclusão digital. Mesmo sendo o país mais rico da América Latina, o Brasil possui baixo índice de penetração de banda larga. De cada 100 habitantes, apenas 5,2, segundo o Barômetro Cisco publicado em dezembro de 2008, têm acesso a essa tecnologia. No Chile (8,5%), na Argentina (7,8%) e no Uruguai (6,5%), os índices de penetração são maiores.

Foto Destaque

Em recente visita ao município de Barra do Piraí, no interior fluminense, o presidente ficou impressionado com o projeto de inclusão digital implantado pela prefeitura com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e da Universidade Federal Fluminense (UFF). Lá, ele viu crianças da rede escolar pública portando computadores individuais.

Em setembro, o presidente encarregou uma comissão interministerial de consolidar, no prazo de 45 dias, uma proposta de um plano nacional de banda larga. A comissão criou dois grupos para analisar o tema - um para tratar de infraestrutura e, outro, de mudanças no marco regulatório. A apresentação da proposta definitiva está prevista para o dia 9 de novembro, quando Lula terá que tomar decisões importantes sobre o projeto.

Uma dessas decisões diz respeito à escolha da entidade que administrará a rede nacional de banda larga. Há quatro possibilidades sendo analisadas. A primeira é usar a antiga holding do Sistema Telebrás, que foi mantida mesmo após a privatização, em 1998, das empresas de telefonia (as teles). Outra opção é criar uma nova empresa.

Uma terceira possibilidade é usar estatais do setor de tecnologia de informação, como o Serpro e a Dataprev, para incorporar as novas atividades. Outra seria encampar a Eletronet, empresa pertencente ao grupo AES que está em processo de falência, e da qual a LightPar, braço de participações acionárias da Eletrobrás, detém 49% do capital.

Das quatro alternativas, a que mais tem ganhado força dentro do governo é ressuscitar a Telebrás. "A Telebrás é uma empresa que já está constituída e tem tudo pronto para tocar essa operação. Para usá-la, basta uma portaria do Ministério das Comunicações, porque a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) já atribui ao ministro o poder de dar uma nova função à estatal", revelou Santanna.

A Telebrás, que é uma empresa de capital aberto com ação cotada em bolsa, tem R$ 283 milhões em caixa. O governo detém 91% das ações. Santanna acredita que, uma vez que a estatal volte a funcionar, o governo poderá promover uma oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) para captar recursos e destiná-los a futuros investimentos. "Podemos pulverizar o capital, como fez a Deutsche Telecom", comparou.

A solução Telebrás não agrada a todos no governo. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, por exemplo, tem restrições. "O nosso foco não é a Telebrás. Lamentavelmente, em vez de a gente falar do plano, que é algo extraordinário, está se falando da Telebrás. Ela tem uma participação mínima nesse processo. Não dependemos da Telebrás para fazer isso. Ela pode ser ator, mas não um ator importante ou decisivo", criticou o ministro em entrevista ao Valor.

Costa defende que o plano de banda larga seja executado em parceria com as grandes empresas de telefonia. Ele cita o acordo firmado, em 2008, entre o governo e as teles para a instalação de internet nas escolas públicas urbanas. Pelo acordo, gestado no Ministério das Comunicações, as empresas trocaram uma obrigação ainda dos tempos de privatização - a instalação de postos de serviços de telecomunicação nas cidades com até 50 mil habitantes - pela implantação de internet em 57 mil escolas, a custo zero para o governo. "Foi um acordo extraordinário", afirmou o ministro.

As divergências entre Santanna e Costa vão além da Telebrás. A visão do primeiro, que encontra amplo respaldo no governo, é a de que há uma falha de mercado no segmento de banda larga no Brasil, um dos mais caros e deficientes do mundo. As empresas só levam infraestrutura de banda larga às regiões do país onde há forte demanda e dinheiro para pagar pelos serviços.

"É fácil entender por que uma parceria com as teles não vai andar. A lógica da telefonia fixa é cobrar por tempo e distância. A lógica da internet é outra. Você não paga por distância e tempo, mas por capacidade alugada (de banda larga)", argumentou Santanna, acrescentando que a legislação não prevê a universalização desses serviços. "Quanto mais rápida for a banda larga, mais mercado a empresa de telefonia vai perder em outros negócios, como voz (telefonia fixa). Por isso, em todo o mundo as teles estão procurando outros negócios, como a geração de conteúdo."

Nelson Simões da Silva, diretor geral da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), sistema que interliga em alta velocidade as universidades e os institutos de pesquisa públicos e privados e foi o responsável pela implantação da internet no Brasil, diz que a privatização do Sistema Telebrás foi muito bem-sucedida ao criar uma infraestrutura de telecomunicação no país. O problema é que essa infraestrutura não chegou às regiões mais pobres do país, limitando o acesso da população aos serviços de internet.

"A RNP não teria a infraestrutura que tem hoje se não fosse o processo de abertura do mercado. Se fosse a Telebrás, no ritmo em que ela vinha (antes da privatização), não teria conseguido. A penetração de telefonia fixa e celular é grande. Estes são os méritos desse processo, mas há falhas. O estímulo para levar infraestrutura onde não há renda não existe", explicou Simões ao Valor. "A política pública falhou nessa área. Portanto, o novo projeto é uma resposta de política pública que não prescinde de uma atuação da indústria de telecomunicação, de forma alguma, mas ele incorpora um ator novo."

Costa está convencido de que é possível levar banda larga aos rincões do país de braços dados com as empresas de telefonia. Na semana passada, o ministro convocou os principais dirigentes das teles para uma reunião em Brasília, na qual solicitou a elaboração de um plano de investimento em banda larga.

"O que nós queremos é motivar as empresas, dizendo: "Precisamos chegar a todas as cidades, estamos do seu lado, queremos participar com o que nós temos e vocês com o que vocês têm"", disse o ministro, acrescentando que o governo não vai explorar comercialmente os serviços de banda larga. "Não queremos roubar o espaço comercial de ninguém. O governo não vai contratar as empresas privadas. Vai indicar o caminho onde elas precisam investir."

Nenhum comentário: