Autor(es): Renata Cafardo e Sergio Pompeu
O Estado de S. Paulo - 01/10/2009
O vazamento da prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) levou o Ministério da Educação a cancelar na madrugada de hoje a prova, que seria aplicada no fim de semana para 4,1 milhões de candidatos em 1,8 mil cidades do País. A decisão foi tomada pelo ministro Fernando Haddad após ter sido alertado pela reportagem do Estado sobre a quebra do sigilo do exame. "Há fortes indícios de que houve vazamento, 99% de chance", afirmou o presidente do Inep, Reynaldo Fernandes, por volta da 1h, por telefone.
Ontem à tarde, o jornal foi procurado por um homem que disse, ao telefone, ter as duas provas que seriam aplicadas no sábado e no domingo. Propôs entregá-las à reportagem em troca de R$ 500 mil. "Isto aqui é muito sério, derruba o ministério", afirmou o homem.
O Estado consultou rapidamente o material, para checar sua veracidade, sem se comprometer com a compra. Haddad, que diz nunca ter tido acesso ao conteúdo da prova, confirmou o vazamento ao consultar técnicos do Inep, órgão do ministério responsável pelo Enem. A comprovação da fraude se baseou em elementos repassados ao ministro pela reportagem, via telefone e e-mail. As questões originais estavam guardadas em um cofre, que foi aberto ontem à noite para confirmar a informação.
No exame que o Estado teve acesso, a prova de linguagens e códigos, que seria aplicada no domingo, tinha na questão número 1 uma tira da personagem de história
Outro trecho literário usado no Enem tinha o verso de Carlos Drummond de Andrade: "No meio do caminho tinha uma pedra/tinha uma pedra no meio do caminho". Mais adiante, a prova reproduzia um texto da revista Veja sobre o filme Touro Indomável, de Martin Scorsese. Outro personagem usado no Enem era o gato Garfield. O programa de mensagens instantâneas MSN é mencionado em uma das questões.
O encontro no qual o Estado viu trechos da prova aconteceu ontem à noite, na zona oeste de São Paulo. O homem que telefonou para a redação estava acompanhado de outra pessoa. Eles disseram ter recebido o material na segunda-feira, de um funcionário do Inep. Afirmaram que o esquema de fraude tinha cinco pessoas. "Ninguém aqui é bandido, ninguém tem ficha na polícia, nós dois temos emprego", disse o homem. Ele afirmou que recebeu o material "de Brasília, de gente do Inep, do MEC". Disse que viu na situação a oportunidade de ganhar dinheiro. "Não tenho motivação política." Ele afirmou que procurou um advogado para orientá-lo. "Registramos em cartório cópias das provas."
Seu companheiro, mais incisivo, cobrou o tempo todo da reportagem uma posição sobre o pagamento dos R$ 500 mil. "Isto aqui é muito grande, eu não quero correr o risco de morrer por nada." Diante da negativa da reportagem, ele se impacientou. "A gente vende isto aqui até por mais dinheiro", disse, revelando a intenção de procurar emissoras de TV.
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