por Luiz Carlos Azenha
Descobri na internet que houve, em 1967, uma tragédia tão grave quanto a que afeta a região serrana do Rio de Janeiro.
Na mídia, o G1 parece ter notado. O Diário do Vale também fez uma reportagem. Mas eu vi primeiro, mesmo, foi no blog do Paulinho.
Foi na serra das Araras, no Rio de Janeiro, mas atingiu também Caraguatatuba, no litoral paulista.
Os detalhes dependem das pessoas que testemunharam, já que aparentemente não há estatísticas confiáveis. Houve muita chuva e desmoronamentos. O número de mortos é estimado, já que muitos nem mesmo foram resgatados.
O fato é que quarenta anos se passaram. Os governos brasileiros pouco aprenderam sobre prevenção desde então.
Qual a grande diferença entre as duas tragédias?
De cara, o fato de que vivemos numa sociedade altamente midiatizada. Com as câmeras dos telefones celulares, todo desabrigado é um repórter em potencial. As imagens se disseminam com uma rapidez impressionante. As chances de um evento catastrófico — ou pelo menos de uma imagem simbólica dele — ser capturado em foto ou vídeo são altíssimas. No caso da tragédia do Rio, é a imagem da senhora sendo resgatada com o cãozinho.
Logo as pessoas passam a tratar os personagens da tragédia como se fossem parte de suas próprias famílias: em algumas horas sabe-se quase tudo a respeito deles.
Ou seja, experimentamos as tragédias de hoje em dia como se estivéssemos lá, não apenas pela profusão de sons, imagens e depoimentos, mas pela expressão de sentimentos que nos aproximam das vítimas.
Hoje as pessoas trocam informações nas redes sociais em um ritmo alucinante. As demandas são feitas velozmente, mas a reação do aparato público é lenta.
É bobagem aquela história, que já li aqui ou ali, que diz que “se os repórteres conseguiram chegar rápido, como é que o estado demorou?” Tolice. O estado precisa chegar com máquinas, com comida, com vacinas, precisa desimpedir estradas, limpar ruas e procurar os soterrados. O repórter precisa de uma câmera, quando precisa.
O fato é que temos uma vaga lembrança da tragédia de 1967, mas vivemos a de 2011.
Nos Estados Unidos, George W. Bush foi “atropelado” politicamente pelo furacão Katrina, em Nova Orleans, justamente por não ter se dado conta dessa diferença de velocidade.
Os estadunidenses dispõem de um serviço meteorológico sofisticado. Os Estados Unidos tem defesa civil. Os Estados Unidos tem bombeiros treinados e equipados, especialmente depois do 11 de setembro. Os Estados Unidos tem uma infraestrutura muito melhor que a brasileira. Mas Washington demorou um ano-luz (24, 48 horas?) para se engajar de fato em Nova Orleans.
Além de revelar de forma dramática a miséria americana, o Katrina também revelou o descompasso entre a urgência dos que se afogavam e a lentidão governamental.
O despreparo demonstrado pelas autoridades brasileiras no Rio de Janeiro não é propriamente uma novidade. Os transbordamentos do rio Tietê, em São Paulo, já foram incorporados ao dia-a-dia dos cidadãos. É só perguntar a qualquer taxista de São Paulo: quando chove, eles correm para casa.
A velocidade na transmissão de informações apenas acentuou a percepção da incompetência. O que é bom, já que o custo político de não agir aumenta (você deve ter notado que não espero solidariedade genuína da parte de nossos eleitos).
A capa da Vejinha-São Paulo desta semana dá uma pista sobre o tipo de cobertura a que assistiremos: o primeiro “culpado” pelas enchentes (paulistas, presumivelmente), de acordo com a chamada de capa, é a pessoa que coloca o lixo na rua fora de hora. Ou seja, antes de colocar o lixo na rua combine com São Pedro! Ou, como escreveu um internauta, peça autorização ao patrão para voltar para casa e colocar o lixo na rua na hora em que o caminhão de coleta passa…
Sabemos que o PIG pretende afogar Lula e Dilma nas águas do Rio de Janeiro, ao mesmo tempo em que faz-de-conta que não entende nada de gerenciamento das represas paulistas, por exemplo. Fica até parecendo que a Sabesp é uma grande patrocinadora!
De qualquer forma, soluções de fato — tanto nas encostas do Rio quanto nas ruas de São Paulo — custam competência técnica e dinheiro, muito dinheiro.
Não dá para cobrar dos governos com a mão esquerda e com a direita levantar um cartaz e pedir estado mínimo (ou apontar para o impostômetro).
Eu cobri os efeitos do trágico terremoto no Chile. O governo chileno levou dias para se organizar e levar ajuda aos atingidos. O governo chileno precisou emprestar telefones via satélite, levados pessoalmente pela secretária de Estado americana Hillary Clinton, para garantir a comunicação do alto escalão. O governo chileno foi alertado pelos Estados Unidos de que haveria maremoto, mas não agiu para alertar a população. Foi um gigantesco fiasco, que passou quase batido por causa do clima de união nacional atrás do qual a presidenta Bachelet se escondeu.
O estado “enxuto” do Chile se estatelou inapelavelmente nas ruas de Concepción.
Retirado do Vi o Mundo
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