por Luis Nassif
Um dos princípios jornalísticos mais sagrados à velha mídia é o do gancho – ou seja, uma matéria sai quando tem algum fato novo que justifique sua publicação.
Com poucas novidades, trata-se de um “cozidão”. O lide da matéria está no pé.
“As provas reunidas pela PF constituem a última esperança do ministro Joaquim Barbosa e da Procuradoria-Geral para que o Supremo condene os réus do mensalão. Nos últimos anos, as opiniões dos ministros do STF sobre o processo modularam-se ao ambiente político – que, sob a liderança simbólica e moral do ex-presidente Lula, fizeram o caso entrar num período de hibernação. Alguns ministros, que em 2007 votaram por acatar a denúncia do Ministério Público, agora comentam reservadamente que as condenações dependem de “mais provas”. Hoje, portanto, o Supremo se dividiu. Não se sabe o desfecho do processo. Sabe-se apenas que, quanto mais tempo transcorrer, maior a chance de absolvição dos mensaleiros. Se isso acontecer, a previsão feita por Delúbio Soares, num passado não tão remoto, num país não tão distante, vai se materializar: o mensalão virará piada de salão. Será o retorno da ficção: era uma vez um país sério”.
É aí que a matéria se entrega. O que a matéria tem de novo, não é relevante; o que tem de relevante, não é novo. E isto faz toda a diferença.
Segundo a revista, as informações constam do relatório adicional solicitado pelo Ministro Joaquim Barbosa à Polícia Federal.
Há que se conferir melhor, mas as informações novas são as seguintes:
1. O aparecimento de um filho de Marco Maciel na história.
2. A inclusão da filha de Joaquim Roriz.
3. A inclusão de Aécio Neves, em algo que não tem nenhum desdobramento maior: uma cota de patrocínio de um evento que existiu, aconteceu e foi pago. Um factóide.
Todos os demais fatos, anunciados bombasticamente pela Época, são antigos e provavelmente já constam do inquérito inicial, que serviu de base para instruir o relatório de Joaquim Barbosa. A saber:
1. O caso do segurança de Lula. Matéria de 2006, do Estadão.
2. Os assessores de Pimentel, demitidos por ele na época.
3. O financiamento da festa de posse de Lula e outras despesas de campanhas, admitidas publicamente por Delúbio Soares.
Ou seja, os fatos retumbantes são velhos; e os fatos novos são irrelevantes. Se todos os fatos relevantes já estavam no relatório de Joaquim Barbosa, qual a razão para o “cozidão”? O fato de, segundo o Estadão, a denúncia de Barbosa provavelmente ser rejeitada pelo STF, por inepta.
Dias atrás o Estadão publicou matéria dizendo que o julgamento do “mensalão” não daria em nada. A matéria é do repórter Felipe Recondo, do dia 27 de março passado.
Sob o título “Pressões no STF criaram ilusão de condenação”, a matéria diz que na época a denúncia de Joaquim Barbosa foi aceita na íntegra, passando a impressão de que não tinha furo, devido à matéria do Globo, sobre a troca de mensagens entre os Ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ocorre que tinha muitos furos.
Diz a matéria do Estadão:
“Quando essa suspeita foi divulgada, houve um clima de constrangimento. O julgamento ficou pasteurizado. De acordo com integrantes da Corte, nenhum ministro sentiu-se à vontade para discutir à exaustão cada ponto da denúncia. O melhor a fazer, disse ao Estado outro integrante do STF, era acelerar a conclusão do julgamento em favor da abertura da ação.
Nesse cenário, o relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, teve o trabalho facilitado. A denúncia foi recebida praticamente na íntegra e criou a impressão de que a investigação não tinha furos. Hoje, ministros dizem que vários pontos do inquérito seriam derrubados facilmente se o julgamento tivesse transcorrido em clima de normalidade“.
Na outra retranca – “Ônus de absolvição será maior para Barbosa» a matéria diz:
“É unanimidade entre os ministros do Supremo que, dos 38 réus que serão julgados, poucos serão os condenados. Como responsável pela ação penal, o ônus de absolver figuras-chave do esquema do mensalão poderá recair, em última instância, sobre Joaquim Barbosa.
Quando o processo chegar ao fim, será preciso lembrar, por exemplo, que o Ministério Público, responsável por produzir as provas necessárias para a condenação, pode ter falhado. Ou que o Supremo Tribunal Federal tem como fundamento a abnegada proteção do indivíduo ante os Poderes – o que no jargão jurídico é definido como garantismo. Assim exige provas cabais para condenar alguém e não aceita uma condenação mesmo que as evidências sejam claras. Ou ainda que a denúncia recebida em 2007 já podia esconder furos, mas que o STF preferiu não atacá-los naquele momento“.
O que provavelmente aconteceu? Para requentar o tema, passaram-se algumas informações adicionais para Época que – seguindo o velho modelo de Veja – requentou o cozidão, procurando criar um fato novo. A intenção é criar novo constrangimento entre os ministros.
Leia aqui nota do ministro Joaquim Barbosa, do STF, repudiando “escândalo” produzido pelo Estadão, na linha dos assassinatos de reputação produzidos diariamente pela mídia brasileira.
Retirado do Vi o Mundo
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