O silêncio ensurdecedor dos governantes brasileiros
por Euler Conrado
Quando a professora Amanda Gurgel deu o seu histórico depoimento de alguns poucos minutos, direto, sem curva, mal sabia que sua fala alcançaria uma repercussão nacional. Um milhão e meio de pessoas acessaram ao vídeo no Youtube até o momento, o que certamente forçou a grande mídia a comentar e a repercutir o assunto. Em seguida, no Programa do Faustão, milhões de pessoas tiveram acesso ao quadro de descaso por que passa a Educação pública no Brasil. Salários baixos, péssimas condições de trabalho, ausência de política de formação continuada e de valorização dos educadores, baixo investimento na Educação pública.
Há coisas que sabemos, que fazem parte da nossa vida, qual paisagem que acostumamos a ver sem perceber que ela é parte de nós. E as vezes é preciso que nos digam, de forma direta, para que passemos a perceber, que aquilo que parece paisagem natural, é a nossa vida, a nossa realidade, e que por isso mesmo não pode continuar assim.
Mas, o que me tem chamado a atenção nessa paisagem é o silêncio dos governantes ante as denúncias feitas, pela força que assumiram tais denúncias. Da presidente da República, passando pelos 27 governadores de Estado e os cinco mil e poucos prefeitos, não se viu um único governante brasileiro a dizer: "alto lá, professora, aqui é diferente".
O que nos mostra o quanto a Educação no Brasil, malgrado os eloquentes discursos de véspera de eleição, é tratada com total descaso. Na verade, estamos diante de uma confissão pública e silenciosa de que os governos, todos eles, fracassaram em relação a esse compromissão tão essencial para o povo brasileiro, contido na Carta Maior do país, que é o de proporcionar Educação pública de qualidade para todos.
Tivéssemos uma Justiça mais autônoma, um Ministério Público mais operoso, um legislativo menos corrompido, e todos os governantes deste país estariam hoje mesmo enfrentando as barras da Justiça, tendo que explicar o que estão fazendo com os impostos arrecadados dos cidadãos brasileiros, já que não pagam sequer o mísero piso salarial do magistério aos educadores.
Tem alguma coisa errada neste país, meus colegas de luta - ou no arremedo dessa república. Como pode um país cujo PIB está entre os oito maiores da planeta pagar salários tão miseráveis aos professores e demais educadores? No estado de Minas Gerais, que está entre os três estados mais ricos da Federação, um professor com curso superior recebe dois salários mínimos, enquanto um deputado, um desembargador, um diretor do TCE, entre outros, recebem entre R$ 30.000,00 e 60.000,00 de vencimentos básicos e ajudas mil. Isso dá uma relação de 1 para 30 ou mais na diferença salarial entre estes dois tipos de servidores públicos.
Talvez seja este um dos motivos do silêncio cúmplice e ensurdecedor ao mesmo tempo dos governantes brasileiros. Um dos motivos, eu diria. Teriam eles que explicar muito mais. Por exemplo, a relação entre o crescimento do crime organizado e a ausência de perspectivas para as famílias de baixa renda em função da não existência de uma Educação de qualidade. O abandono da carreira do magistério por parte de centenas de colegas, é outra explicação que os governantes devem à Nação brasileira. Abandono que se dá pelos salários pouco atraentes, mas também pelas péssimas condições de trabalho e pelas doenças contraídas em sala de aula.
Sob o silêncio também cúmplice dos legislativos, dos judiciários, dos tribunais de contas, cada governo tem uma desculpa esfarrapada para dar. Uns preferem dizer que o futuro pré-sal vai resolver o problema da Educação e da Saúde pública. O que é uma grande piada, pois o país não tem problemas de falta de dinheiro no presente, para justificar o pouco investimento que faz. O que está errada é a distribuição dessa riqueza: muito para poucos, e pouca coisa para a maioria pobre. Com pré-sal ou sem pré-sal, se a lógica for a mesma, as diferenças continuarão e poderão se ampliar. O país cresce, mas não de forma igual para todos - ou pelo menos com uma diferença menor. Alguns conseguem a mágica de se enriquecerem 20, 30 ou 50 vezes mais em poucos anos. Políticos, empreiteiros, banqueiros, agronegócio, estão entre estes felizardos.
Mas, os professores... para arrancarem um mísero aumento precisam realizar greves e mais greves. E as desculpas dos governantes continuam. É a Lei de Responsabilidade Fiscal que não permite - dizem alguns; é o acórdão do STF que não é publicado nunca - dizem outros, com a mesma cara lambida; só faltam dizer que o Papa, lá do Vaticano, não autorizou os reajustes salariais para os educadores. Qualquer desculpa esfarrapada serve para não nos pagarem um salário mais digno, algo mais decente, que garantisse pelo menos a nossa sobrevivência sem que precisássemos correr atrás de outros cargos ou bicos para dar conta de pagar parte das nossas despesas cotidianas.
Haverá um dia em que o povo brasileiro, e de todo o planeta, dará e dirá um NÃO, com toda força, a tudo isso. Um basta, a essa farra que fazem com o suor do nosso trabalho, neste invertido mundo, onde os milhões que produzem as riquezas disputam as migalhas, enquanto a minoria rica se apropria de todas essas riquezas que ela não produziu.
Enquanto isso não acontece, os governantes, silentes, continuarão comprando a mídia para divulgar propaganda enganosa acerca da Educação que não existe de fato, ou que existe apenas na maquete, ou nos exemplos isolados e tomados como "excelência" para o público externo. Mas, a realidade nua e crua continua sendo o descaso dos de cima em relação à Educação de qualidade e à valorização dos educadores.
Continuamos sem receber o nosso piso salarial, mesmo este mísero piso do MEC; nem tampouco o nosso terço de tempo extraclasse. Continuamos vítimas dos cortes das gratificações e vantagens, para que o nosso salário permaneça sempre abaixo da crítica. Somos tratados como uma categoria essencial no discurso, mas na prática, somos vistos como aqueles chatos e inconvenientes, que não sabem se colocar no devido lugar. Tomadores de conta de alunos, com curso superior! É assim que eles nos vêem. E é assim que às vezes infelizmente nos comportamos, quando não vamos à luta.
O silêncio dos de cima - agora não só dos governantes, mas de toda a "classe" política, de todas as camadas prvilegiadas deste país - ante a realidade exposta de maneira direta, nua e crua por uma das nossas colegas, é o retrato mais fiel do descaso com que a Educação pública, voltada para as famílias de baixa renda é tratada neste território ocupado oficialmente no ano de 1.500.
O silêncio deles é ensurdecedor e deve provocar em todos nós, os de baixo, uma ira do mesmo tamanho. Precisamos ir para as praças e ruas, em Minas e no Brasil, a gritar bem alto: eles estão mudos, porque nada têm a dizer em relação à denúncia feita. O que faremos então? É a pergunta que pretendo deixar no ar para que todos aqueles que se sentirem atingidos por este silêncio reajam. Eu me sinto, e no dia 31 de maio quero dar a minha resposta. E você, colega de luta?
Um comentário:
Juntos nessa luta! Eu também.
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