Reproduzido do Blog Carlos Santos
Governo Rosalba "não se esmerou em apresentar um plano para gestão" do Estado
Ex-secretário de Trabalho e Ação Social do Estado do Rio Grande do Norte, em 1994 (Governo José Agripino/Vivaldo Costa), cargo que voltou a ocupar em 2001 (Governo Garibaldi Alves); ex-secretário do Planejamento do Governo Wilma de Faria (PSB), o ex-prefeito de Lucrécia e ex-candidato a vice-governador, VAGNER ARAÚJO, é nosso entrevistado especial desta semana. Atual secretário de Gestão de Pessoas do Governo Micarla de Sousa (PV), ele quebra o silêncio em primeira mão para o Blog do Carlos Santos, avaliando a propalada crise financeira no Estado e outros temas correlatos.
Blog do Carlos Santos – O atual secretário da Administração e Recursos Humanos do Estado, Governo Rosalba Ciarlini (DEM), Anselmo Carvalho, afirma à imprensa de Mossoró (Jornal O Mossoroense), que os gestores passados, à luz da Lei de Responsabilidade Fiscal, tiveram uma postura de “irresponsabilidade”. Não teria ocorrido estudo de impacto na folha de pessoal, à concessão de aumentos salariais? Verdade ou sofisma?
Vagner Araújo - Discurso político, como tantos outros que já cansam a população em todo o Estado. Ponha-se numa lupa e veja que as leis aprovadas têm lá um artigo onde diz que a implantação dos planos estão condicionados à regularidade dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Tivemos o cuidado de fazer este condicionamento que, aliás tem sido bem usado pelo atual governo, embora haja controvérsias com estes limites, já que as diversas interpretações da LRF sobre o que deve ou não ser computado nele dá ao governo a flexibilidade de jogá-lo para cima ou para baixo, segundo sua conveniência do momento – que é o de não atender às categorias. A rigor, a discussão deste limite deve considerar sua fórmula e forma de cálculo. Para que se tenha clareza sobre o que está sendo considerado ou não para seu cômputo final.
BCS – A governadora Rosalba Ciarlini e seus mais importantes auxiliares insistem na tese de que encontraram um ambiente de “terra arrasada” no Estado. Bate com a herança deixada pela era “Wilma de Faria (PSB)-Iberê Ferreira (PSB)?
Vagner Araújo – Já está provado que não. Olhe os saldos e superávits financeiros nos primeiros balanços bimestrais ou quadrimestrais de 2011. O estado é obrigado a divulgar na internet e no Diário Oficial. Vê quanto de recursos estão sobrando para o atual governo. Coisa de R$ 600 milhões. Alem do mais, quando foram listar as tais dívidas deixadas para atender requerimento da Assembleia, incluíram coisas absurdas que jamais poderiam ser consideradas como tal, já que são obrigações correntes de todo governo, como as contra-partidas de obras que ainda estão em andamento, estão dentro de seu cronograma contratual e, portanto, não são dívidas atrasadas. São obrigações futuras, normais de qualquer governo. Aliás, algo positivo. Mostra que ficaram – igualmente – receitas, dinheiro entrando no estado para estas obras. Acho que o PSB falhou na comunicação porque deixou que teses como estas prosperassem sem respostas à altura.
BCS – O final da era Wilma-Iberê foi marcado por prenúncio de grave crise: rapou-se o “fundo do tacho” para pagar folha, até com o inusitado empréstimo de recursos do fundo judiciário, para complementação de pagamento de pessoal. A que se deve esse quadro?
Vagner Araújo – Os estados, assim como as prefeituras, sofreram nos anos de 2009 e 2010, fortes efeitos da crise econômica iniciada em 2008. Muito dinheiro previsto no orçamento deixou de vir do governo federal a título de transferências correntes, causando dificuldades para o cumprimento da programação financeira. Algo que se reverteu nos primeiros meses deste ano, com grande elevação das receitas, o que já era esperado. Apesar disto, o governo foi passado com a folha de pagamento em dia, já com o mês de dezembro e o décimo pago dentro do mês, com todos os programas funcionando, com um grande conjunto de obras em andamento e com saldos financeiros elevados em contas e contratos destinadas a projetos e obras como adutoras, saneamento, estradas e outras. Francamente, não se pode considerar isto terra arrasada. O discurso político neste sentido é estratégia batida de quem não se esmerou em apresentar um plano para a gestão estadual, sequer se prestou a realizar uma transição administrativa à altura da dimensão de um estado – que é bem diferente de uma prefeitura.
BCS – A Assembleia Legislativa, então presidida pelo atual vice-governador Robinson Faria (PMN), que era aliado da governadora Wilma de Faria, à época, deu pleno aval à aprovação dos vários projetos que provocaram reajuste salarial de várias categorias. O atual Governo do Estado, entretanto, omite essa abordagem em seu discurso. Que papel teve a AL na discussão e endosso a essas matérias?
Vagner Araújo - Não só deu aval como trabalhou para aumentar o dispêndio do Estado com os planos, aprovando emendas e até derrubando vetos da então governadora a medidas que elevavam os encargos financeiros para o governo, desde a votação do orçamento para 2010. Ou seja, tiro no pé de quem talvez não imaginava que viria assumir o governo num momento seguinte.
Planos salariais são leis aprovadas na Assembléia. No caso, a oposição – hoje situação – era maioria na época da aprovação e detinha a presidência da Casa, o hoje vice-governador Robinson Faria. Via de regra, os projetos de lei encaminhados pelo Executivo eram emendados pelos deputados da atual base do governo, aumentando a despesa, criando mais encargos financeiros para o Estado. Então… de que irresponsáveis estamos falando?
Veja bem, não falo em nome do PSB nem de Wilma nem de Iberê, dado que estou afastado do partido para exercer o cargo de secretário de Natal. Mas estou esclarecendo questões relevantes com base no conhecimento que tenho e de ter participado do governo anterior.
BCS – Em sua avaliação técnico-política, conhecendo tão bem a realidade financeira e da relação de forças político-partidária, no RN, estamos diante de uma crise de números ou de gestão?
Vagner Araújo – Apesar das divergências políticas de quem disputou em chapa majoritária com o atual governo, sou um norteriograndense que ama e acredita neste Estado, trabalha e torce para que as coisas dêem certo, seja em que governo for. Comecei a me preocupar – e na época, a denunciar – que a chapa que restou vencedora, ainda na campanha, não apresentava qualquer plano, não dava qualquer sinal de que tinha um projeto para o Rio Grande do Norte. Não demonstrava, sequer, conhecer a realidade administrativa do estado. Nada. Fizeram a campanha só na base do ‘oba-oba’, na onda eleitoreira que se formou e que arrastou a maior parte do eleitorado, como infelizmente ocorre na nossa cultura política ainda em formação. Conhecido o resultado, preocupei-me ainda mais porque não vi nenhum esforço de se realizar uma transição administrativa, de se conhecer de perto, focar nos assuntos do estado, nas suas diversas áreas.
Participei da transição de Wilma, em 2002. Eram no mínimo 3 pessoas trabalhando em cada área de governo, por cada secretaria. Uma equipe grande, multidisciplinar, que passou 60 dias trabalhando dia e noite, fins de semana… com técnicos experientes, ouvindo a equipe que saia, estudando como funcionava cada programa, cada ação, cada área de governo, já tomando decisões, reunindo prefeitos para conversar sobre assuntos como dengue, previsão de seca, indo a Brasília ver andamento das parcerias lá, enfim… em uma grande ação preparativa para assumir o governo. Por isto, apesar do quadro de dificuldades, dos desarranjos deixados pelo então governador Fernando Freire, o novo governo já entrou trabalhando, sabendo para onde ia, lançando programas, iniciando obras, dando uma cara nova ao estado. Uma obra como a ponte Forte-Redinha, por exemplo, nao teria sido realizada se nao tivesse tido este plenajamento, este trabalho, mesmo antes de assumir.
O atual governo colocou 6 pessoas para a transição, e já faltando poucos dias para assumir. E todos da área meio. Quem fez a transição na saúde? Quem fez na educação? Quem fez na área de desenvolvimento econômico, na segurança? Nem nomes para estas áreas se tinha. Muitos foram escolhidos de última hora, depois de idas e vindas, de convites recusados, de brigas internas por espaço. Órgão importante entregues a pessoas de perfil duvidoso. Auxiliares do governo anterior sendo chamados de volta, reaproveitados, por falta de opção. O resultado não poderia ser outro. Mas… continuo torcendo que se encontre o rumo. O estado precisa e merece voltar a crescer, sair do noticiário negativo em que se encontra nos últimos meses no cenário nacional, até porque isto arrasa com uma dos nossos principais meios de vida – o turismo. Turista nenhum escolhe como destino um lugar onde há greve generalizada, onde a segurança pública está simbolizada pela imagem de um preso acorrentado a uma bicicleta no quintal de uma delegacia.
BCS – O senhor ocupa a titularidade de uma pasta, no Governo Micarla de Sousa. Ela vive um desgaste avassalador. Há futuro para a gestão Micarla?
Vagner Araújo – Primeiro, veja os jornais de Fortaleza, João Pessoa, Recife e Salvador… Você não vai encontrar diferença no quadro de desgaste que ocorre em Natal e nas prefeituras destas outras capitais. Logo, temos um problema generalizado, o que indica que há motivos exógenos, ou seja, fatores externos, que fogem ao controle ou à vontade destes governantes que estão a causar transtornos financeiros, de caixa, de capacidade de realizar obras e de manter serviços públicos a contento. Consequentemente, vem o desgaste político para os gestores, infelizmente. Como a vida é um fato local e em meio ao advento positivo e democrático, ainda que desordenado, das novas mídias e das redes sociais, a maioria das pessoas são facilmente levadas a atribuir à prefeita, a exclusividade da culpa pelo problema.
Mas aí onde cabe uma importante reflexão: para alem do futuro da gestão Micarla, devemos entender que o que está em jogo é o futuro de Natal. Desta cidade linda, altaneira, que se prepara para seu apogeu turístico, econômico e social: sediar a Copa do Mundo de Futebol.
Todo e qualquer transtorno na cidade, principalmente aqueles provocados ou intensificados como oportunismo, não está a atingir apenas a gestão da prefeita. Mas, de forma muito mais grave, a cidade e o seu futuro. Principalmente em momento delicado como o que estamos vivendo.
Eu dou o testemunho de que a prefeita tem feito grande esforço em contornar os problemas. Fez até redesenho político-administrativo do seu governo para enfrentar a crise, abrindo mão de certos apoios políticos para dar foco na gestão. A minha presença em sua administração é, inclusive, grande prova disto. Ela superou entraves partidários e até o costume político vigente para me convidar. Eu fiz o mesmo ao aceitar. Porque acho que na hora da dificuldade, quando o interesse de toda uma cidade está em jogo, devemos procurar ajudar. E não dificultar ainda mais as coisas.
Tenho fortes motivos para concluir que a gestão Micarla encontrou seu rumo, apesar disto ainda não ter sido percebido pela maioria. Agora, falta atingir o ritmo ideal a que as suas metas, que incluem projetos urbanísticos que vão mudar Natal com investimentos jamais vistos em nossa história e que chegam a R$ 1 bilhão possam se concretizar. Esta é uma tarefa de todos. Por Natal.
BCS – E qual o futuro de Vagner Araújo, após ensaiar disputa a deputado estadual, quase ser candidato a deputado federal e terminar como candidato a vice-governador de Iberê, sem êxito eleitoral?
Vagner Araújo - Primeiro, quero dizer que sinto-me realizado em ter sido candidato a vice-governador, independente do resultado final. Configurar como uma opção para governar um estado, participar de uma chapa que recebeu mais de meio milhão de votos… não é pouca coisa para quem veio de onde eu vim, tendo acabado de completar os 40 anos de idade.
Quanto ao futuro tenho sempre dois caminhos a seguir. O técnico, profissional, exercer missões técnicas de que gosto muito e com que me realizo – o que estou fazendo agora. E o político que, no caso, nao depende só de mim. Depende, fundamentalmente, da evolução do nosso quadro político-cultural. Nao me considero um político convencional, destes que segue um roteiro populista-midiático. Ainda que isto seja considerada condição para se eleger a qualquer cargo eletivo mais importante. Discordo desta prática e não me vejo reforçando-a.
Meu sonho era chegar o dia em que as campanhas se voltassem para discutir e eleger projetos, idéias, ações, resultados efetivos. O candidato com mais chances fosse aquele que demonstrasse a capacidade de trabalhar gestão. De enfrentar e prover soluções para a despoluição do Rio Mossoró, de encontrar solução para o aeroporto da cidade, de avançar na educação, na saúde, na geração de empregos, por exemplo.
A eleição da Presidenta Dilma abriu-me esperanças neste sentido. Ela não tem viés populista. É uma gestora. Se o governo dela der certo – como espero que dê – poderá haver grande mudança na forma de votar do brasileiro, em favor de perfis mais técnicos, mais comprometidos com gestão e menos politiqueiros ou demagógicos. Aí as coisas podem ficar mais fáceis e certamente haverá mais espaço na política para pessoas como eu.
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